Nesta altura, o Jornalismo Literário passou por um período de descrédito, pois, como refere o repórter, “os jornalistas puseram na cabeça que eram artistas e inventaram um bocadinho”, criando, por exemplo, personagens compósitas, às quais atribuíam características de diferentes pessoas.
Por volta dos anos 80, o Jornalismo Literário voltou à normalidade e os jornalistas continuaram a cumprir as “regras do jogo”.
O Jornalismo Literário é então, segundo Paulo Moura, quase como um romance, porque é profundo e nos deixa a pensar, enquanto leitores, sobre determinado assunto, fazendo-nos levantar questões sobre o mesmo, mas não é ficção, pois as suas personagens são reais e aí, sim, é parecido com o jornalismo tradicional. Assim, parece pertinente afirmar que se posiciona algures entre o jornalismo convencional e este género literário.
As descrições são exaustivas, contam-nos uma história, transpõem – nos para um determinado ambiente, fazem-nos ler o filme que o jornalista viu.
O tempo, tal como nos romances, também não é linear. Pode haver avanços ou recuos, mas o princípio, meio e fim estão lá, não precisam é de ser contados por ordem cronológica, para que saibamos “a quantas andamos”. Já no jornalismo tradicional isto não acontece, tudo é mais natural, mais convencional.
O Jornalismo Literário, sendo sempre fiel à realidade, aposta na profundidade, questionando-se, nas palavras de Paulo Moura: “Mas será que nós só podemos ser profundos quando falamos de histórias inventadas?”
Contrariamente ao jornalismo tradicional, que relata o que é comum em relação a pessoas ou a situações, o Jornalismo Literário procura o que é único, propondo-se a “descrever o mundo real com a inteligência com que o romancista descreve personagens ficcionais.”
Para tal, naturalmente, algumas características diferenciam-se do jornalismo convencional.
Uma delas é a pesquisa. Um jornalista literário pesquisa de forma diferente, mergulha o mais próximo possível da realidade sobre a qual se debruça para sentir o que os protagonistas sentem, para perceber o seu comportamento, pois, “a ambição do Jornalismo Literário é conhecer melhor e mais profundamente.”
Outra é a escrita. O Jornalismo Literário “rouba recursos, técnicas aos escritores… à literatura”, como a inserção de diálogos no texto ou a descrição dos cenários e a caracterização das personagens, que, sendo reais, não devem ser adjectivadas de uma forma directa, o leitor é que deve perceber quais são os seus atributos, através da profundidade que o jornalista emprega no texto, porque “Jornalismo Literário não é enfeitar texto.”
Ao escrever, um jornalista literário pode também “jogar” com o tempo, segundo Paulo Moura, quase como “uma espécie de Deus que pode dominar o tempo”.
O suspense vem, muitas vezes, aliado à recorrência de introdução de cenas na narrativa, como estratégia para prender o leitor, tal como acontece nos romances.
O jornalista aponta um dos maiores desafios do Jornalismo Literário como sendo o de “encontrar a história, mesmo quando, aparentemente, ela não está lá”.
Para exemplificar esta situação, decidiu recorrer a um exemplo prático e contou a história de uma das suas muitas reportagens que, mais tarde, dera origem a um livro. Fê-lo com um suspense que deixou todos presos às cadeiras à espera de saber o final e, mesmo quando revelou que o “segredo”, afinal, não era assim tão especial, valeu a pena: cumpriu o objectivo.
Deste modo, demonstrou que mesmo quando, à primeira vista, uma história não parece uma boa história, o modo como a contamos, o pormenor que destacamos pode fazer dela uma excelente intriga, no sentido em que, por vezes, a acção está onde menos esperamos.
Paulo Moura destacou também a importância da imparcialidade no Jornalismo Literário, pois, tal como ocorre no jornalismo tradicional, o jornalista não deve estabelecer relações com as personagens que ultrapassem o campo meramente profissional: “o jornalista não é um amigo e pode prejudicar a pessoa, mesmo sem querer.”
No entanto, na opinião do repórter, os protagonistas, apesar de, por vezes, verem retratadas situações menos favoráveis das suas vidas de uma forma completamente imparcial, sem qualquer tipo de eufemismo, acabam por apreciá-lo porque “sentem que a sua vida é elevada a estatuto de obra de arte” que é o Jornalismo Literário, quando bem feito.
E assim se resume a vinda de Paulo Moura ao curso de Ciências da Comunicação onde de uma forma divertida e descontraída, abordou muitos mais temas do que o Jornalismo Literário, partilhando também algumas das suas “aventuras” em reportagem e esclarecendo questões que se foram levantando.
No seu discurso, ficou bem patente que o jornalismo pode ser subjectivo e estimular a criatividade de cada um, sem, contudo, nunca deixar de ser imparcial e fiel à realidade e que este vai muito para além da escrita de textos com título, lead e corpo da notícia.